domingo, 18 de janeiro de 2009

Nietzsche, interruptores mentais e drágeas de iluminação

Nietzsche escreveu que quando você olha longamente para o abismo, ele também olha para você. Acredito que o foco humano é, de fato, muito poderoso - para o bem e para o mal. O ideal é o foco consciente. Quer dizer, projetar conscientemente realizações e agir de modo a atingir os objetivos a elas relacionados, pessoais e profissionais. Atingir tal grau de auto-gerência seria o auge da criatura bem resolvida, o supra-sumo do sucesso. Digo "seria", porque nossa cabeça teima em manter focos independentes da nossa vontade e, se deixamos a festa correr solta, corremos o risco de sustentar vitaliciamente nosso psiquiatra.
A depressão e a angústia são exemplos dessa roda viciosa. Num mar revolto de sentimentos negativos, nosso foco termina por encontrar desânimo, sensação de impotência, revolta, amargura, culpa, arrependimento, autopiedade e assim por diante. Um redemoinho cada vez mais forte e profundo, de dor e cansaço. E tudo, durante tal estado, parece encaixado perfeitamente, e sentimos que não há saída, a não ser uma ruptura brusca. Ou uma mera resignação. Não nos damos conta de que a autoria do nesfasto quebra-cabeças é nossa. O foco fica tão estreito que qualquer possibilidade de abertura de visão soa como luz imprópria, como se clarões não fosses admitidos ou, ainda, não fizessem parte da cena.
A mesma capacidade que temos para construir essa miscelânea de sofrimento aparentemente sem fim pode ser replicada para construir visões equilibradas. Não digo que é fácil, pois, de longe, vê-se que é árduo o caminho. Mas é viável. Na concretude é que está o ralo da dor. Fantasmas são facilmente combatidos com resultados práticos e com distanciamento. Acendem-se lâmpadas e martírios e horrores transformam-se em remela no olho ou numa unha quebrada.
Precisa-se ampliar a visão, abrir o foco. A macrovisão destrói as primeiras manifestações de sofrimento se oportunamente acionada. É treinamento. Talvez seja também fruto de experiência - e por isso impossível de trasmitir. Não custa, porém, tentar. Uns têm algumas vantagens, outros têm outras. Iluminação em drágeas, se for preciso.

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